O fim da correção do salário mínimo pela inflação em momentos de crise fiscal, proposta em estudo pelo governo Bolsonaro, afetará diretamente 34 milhões de aposentados, pensionistas e segurados do INSS, que terão benefícios congelados. A ideia analisada pela equipe econômica é retirar da Constituição a previsão de que o piso nacional seja reajustado pela inflação (o índice é o INPC), justamente o indicador que aumenta o mínimo e corrige benefícios do instituto. Segundo cálculos do governo, o congelamento renderia economia entre R$ 35 bilhões e R$ 37 bilhões.
A proposta é que, em momentos de grave desequilíbrio fiscal, como o atual, seja possível congelar mesmo os aumentos nominais (ou seja, dar a variação da inflação) da remuneração por alguns anos, até a recuperação da saúde financeira das contas públicas. A medida é criticada pelo presidente do Sindicato Nacional dos Aposentados e Pensionistas, João Batista Inocentini, e pela presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário, Adriane Bramante.
Inocentini lembra que a Carta Magna garante a correção do mínimo pela inflação e que o assunto foi pautado durante a discussão da Reforma da Previdência. “Tem que valer a Constituição de 1988. Não dá para o governo agora querer mudar o que já foi discutido”, adverte.
O sindicalista prometeu mobilizar parlamentares, além do deputado Paulinho da Força (SD-SP), para pressionar o governo a adotar uma política de valorização do mínimo, como existia antes do governo Bolsonaro. “A política de valorização com ganho real é fundamental”, assegura. “É preciso haver recuperação do poder de compra, senão será um achatamento nos vencimentos. Mais de 67,5% dos aposentados vivem com um salário mínimo”, acrescenta Inocentini. “É um absurdo que a conta seja sempre paga pelo aposentado”, finaliza.
“A correção dos benefícios já tem sido irrisória, diminuindo aposentadorias a cada ano. Congelar a correção é piorar ainda mais a situação dos aposentados”, alerta.
Aumento real
Hoje, a Constituição prevê que é direito social do cidadão ter acesso a um salário mínimo “com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo”. Assim, o governo se vê obrigado a, todos os anos, recompor ao menos a inflação. Até o ano passado, a política de reajuste fixava uma correção pelo Índice de Preços ao Consumidor (INPC) do ano anterior mais o Produto Interno Bruto (PIB) de dois anos antes. Com o vencimento desse modelo, o governo se debruça sobre uma mudança.
A política de aumentos reais (acima da inflação) vinha sendo implementada nos últimos anos, após ser proposta pela então presidente Dilma Rousseff e aprovada pelo Congresso. Os reajustes pela inflação e variação do PIB vigoraram de 2011 a 2019, mas nem sempre o salário mínimo subiu acima da inflação.
Em 2017 e 2018, por exemplo, foi concedido o reajuste somente com base na inflação porque o PIB dos anos anteriores (2015 e 2016) teve retração. Por isso, para cumprir a fórmula proposta, somente a inflação serviu de base para o aumento.
Para 2020
A proposta de orçamento para o ano de 2020 prevê aumento do salário mínimo dos atuais R$ 998 para R$ 1.039 a partir de janeiro do ano que vem, levando em conta a variação da inflação. Há quem defenda, no entanto, não dar nem mesmo a inflação como reposição salarial para abrir espaço no Orçamento para despesas de custeio da máquina pública e investimentos.
Segundo o Ministério da Economia, cada R$ 1 a mais de aumento no salário mínimo gera um gasto adicional de R$ 302 milhões ao governo. Isso porque uma série de benefícios sociais, como o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e o abono salarial, é indexada ao salário mínimo e tem, por isso, um aumento proporcional.
Maia cobra política de valorização do mínimo
A falta de uma política de valorização do mínimo é criticada pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Segundo ele, o governo precisa decidir qual é a política de salário mínimo que deseja promover e ao que vai ser atrelado para evitar as discussões sobre eventuais correções.
“Tem que ver o que vão encaminhar. Problema é que salário mínimo tem algumas vinculações e qualquer aumento do salário mínimo impacta outras despesas do governo. Precisa decidir qual é a política do salário mínimo e ao que está atrelada, porque se não vai ter sempre essa discussão se cabe ou não essa correção do salário mínimo que pode impactar outras questões”, disse Maia.
O presidente da Câmara também afirmou que a questão da desoneração da folha de pagamento não é a única saída para a retomada do emprego. “O problema do emprego não está só relacionado ao custo, está relacionado à possibilidade de recuperação da demanda, de a sociedade poder voltar a consumir. Claro que o custo da folha é alto, mas só desonerar a folha não resolve”, disse.
Fonte: Jornal O Dia