Em sua última edição, a revista “The Economist” aponta o novo salto da tecnologia. Durante três anos, a Apple trabalhou para fazer com que seus produtos e softwares processassem informações médicas. No dia 24 de janeiro, anunciou que a próxima novidade para o iPhone – para o mercado americano – incluirá a função Health Records, que permitirá ao usuário gerenciar e compartilhar os dados sobre sua saúde. A Apple não está sozinha, porque os outros gigantes do setor já abraçaram esse mercado. No dia 30 do mês passado, a Amazon divulgou a criação de uma espécie de seguradora de saúde, sem fins lucrativos, para seus próprios funcionários – e quem conhece Jeff Bezos sabe que isso será apenas um ensaio para conquistar um público muito maior. A Alphabet, controladora do Google, lançou uma empresa de cuidados médicos que usa inteligência artificial e garante que consegue até prever, estatisticamente, a piora de doentes, dando mais tempo para os doutores agirem. Essas companhias vendem aparelhos e softwares para hospitais, mas as mudanças vão ser de grande magnitude: as poderosas plataformas tecnológicas dessas empresas serão capazes de criar canais para levar cuidados médicos às pessoas, como monitoramento contínuo da saúde e aplicativos para o gerenciamento de doenças crônicas. Há um boom de startups criando aplicativos, alguns inclusive com sensores: o FDA (Food and Drug Administration, o equivalente americano da Anvisa) liberou o BlueStar para diabéticos – ele dá informação em tempo real sobre a taxa glicêmica do paciente, que administra a quantidade de insulina de que precisa.
No Brasil, está disponível o primeiro aplicativo de autorreabilitação para auxiliar pacientes com sequelas pós-AVC: o i-GSC (Guided self rehabilitation contract, ou guia de autorreabilitação guiada), criado pelo médico francês Jean-Michel Gracies e disponibilizado por um grupo farmacêutico. O acidente vascular cerebral é a segunda causa de mortes – são 100 mil por ano – e a primeira de incapacidade no Brasil. Dos 60% que sobrevivem, metade acaba tendo algum tipo de sequela, como perda de força ou espasticidade, uma espécie de contração muscular que se assemelha a uma cãibra constante. Nem sempre a pessoa consegue fazer a reabilitação, e é aí que entra o aplicativo, que apresenta exercícios de alongamento e treinos ativos que podem ser feitos em casa. É preciso que o médico forneça login e senha para o paciente, que terá um cadastro com seu perfil e os dados sobre a deficiência a ser tratada. A ferramenta salva e vai atualizando as prescrições do terapeuta, com detalhes como o número de exercícios e sua duração. Também tem tutoriais em vídeos e fornece o registro diário da execução de cada exercício, para acompanhamento dos profissionais de saúde – ou seja, não vai dar para enganar o médico ou terapeuta.
Um dos primeiros profissionais de saúde a utilizarem o i-GSC foi o médico fisiatra Tae Mo Chung, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Ele afirmou que os exercícios de autorreabilitação existem há bastante tempo, mas esbarravam na dificuldade de o paciente ter disciplina para realizá-los. “O aplicativo cria um contrato moral”, comenta o professor, que participou de seu desenvolvimento. “O paciente faz as séries propostas e o relatório segue em tempo real para o profissional de saúde. Fizemos um piloto muito bem-sucedido no Hospital das Clínicas, com cinco pessoas de idades diferentes, e a evolução foi positiva. Os exercícios são simples, de modo que todos podem acompanhar, a não ser que as funções cognitivas tenham sido afetadas. Quando o paciente se sente capaz, aumenta sua adesão e, consequentemente, há uma melhora funcional”, conclui. Nesses casos foi tratada a paresia espástica, uma disfunção dos movimentos de um ou mais membros, mas o doutor Tae Mo Chung prevê que a utilização da ferramenta poderá se estender para diminuir sequelas em doenças como esclerose múltipla e paralisia cerebral, entre outras. O aplicativo é gratuito e está disponível para os sistemas iOS (Apple) e Android (Google) e também para computadores Windows.
Fonte: G1