A brincadeira que há anos entretém crianças e adultos no subúrbio e nas comunidades do Rio ganhou título sério e virou patrimônio cultural, histórico e imaterial do estado. De autoria do deputado Paulo Ramos (sem partido), a lei que torna a prática de origem oriental de empinar pipas um bem do Rio de Janeiro foi sancionada na última quinta-feira pelo governador Luiz Fernando Pezão. A diversão resiste à era dos celulares e ainda movimenta os fins de semana em muitos cantos do Rio.
No Largo do Estácio, onde todos os sábados, domingos e feriados, centenas de praticantes se reúnem, apesar da frequência grande de crianças, chama atenção a quantidade de adultos. O fisioterapeuta Eduardo Rodrigues, de 52 anos, não abre mão da diversão.
— É uma brincadeira, mas também é um jogo. Ninguém empina pipas só para ver ela voar. A graça é cruzar e cortar a linha do adversário. E, para isso, tem que estar preparado e ser habilidoso para usar o vento a seu favor — diz, fazendo questão de ressaltar que a disputa ocorre apenas entre linhas e rabiolas: — A rivalidade é só na hora de cruzar as pipas. Depois, vem a zoação, e a amizade continua — garante.
Na disputa de pipas do Estácio, crianças, jovens e adultos se reúnem em grupos e buscam cortar as linhas de membro de outra equipe. Há momentos de investidas que parecem estar coordenadas e lembram a dinâmica de muitos esportes coletivos. Até as comemorações são personalizadas.
— Nosso grupo, quando corta alguém do outro, comemora imitando macaco. É uma forma de celebrar e mostrar quem foi que cortou — diz o instalador de equipamentos de segurança Ivan Luiz Couto, que empina e vende pipas há 50 anos em São Cristóvão.
Além de salientar o aspecto lúdico e de lazer, o deputado Paulo Ramos defendeu a lei argumentando que as pipas tiveram importância para pesquisas e descobertas científicas e são populares há muitos anos em todo o estado. Apesar de ser mais popular no período de férias, em alguns redutos, como no Largo do Estácio, os encontros de pipas ocorrem o ano todo e reúnem gente que vai de longe. Segundo os frequentadores, no próximo sábado serão mais de mil praticantes.
— Vem gente da Baixada Fluminense, de São Gonçalo, de Cachoeira de Macacu e até de Cabo Frio — conta Álvaro Santos, de 27 anos, que diz empinar pipa desde os 5.
Para Ivan Couto, o título de patrimônio veio só para oficializar o que já está enraizado na cultura do Rio.
— Sempre foi patrimônio. Eu duvido que exista algum menino que nasceu aqui e teve uma infância feliz sem ter tido contato com pipa — observa.
O risco das linhas cortantes
Foi através das pipas que o grande Santos Dumont conseguiu voar no famoso 14 Bis que, no final das contas não deixa de ser uma sofisticada pipa com motor. Em 12 de dezembro de 1921, Marconi utilizou pipas para fazer experiências com a transmissão de radio, teste que, mais tarde, seria utilizado por Graham Bell em seu invento, o telefone.
, a “linha chilena” – um fio de algodão, encerado com quartzo moído e óxido de alumínio – é uma unanimidade. O fisioterapeuta Eduardo Rodrigues de 52 anos empina pipas todo fim de semana, cheio de fitas adesinas nos dedos, mas não abre mão da linha potencialmente cortante.
– É uma brincadeira, mas também é um jogo. Ninguém empina pipas só para ver ela voar, a graça é cruzar e cortar a linha do adversário. E para isso, tem que está preparado – diz, fazendo questão de ressaltar que a disputa ocorre apenas entre linhas e rabiolas.
Apesar do caráter lúdico e recreativo das pipas, ressaltados pelo deputado Paulo Ramos para a justificar o título de patrimônio cultural, histórico e imaterial do Rio, a facilidade com que o praticantes conseguem comprar o cerol e a “linha chilena” contribui para a popularização dos artefatos. O profissional de limpeza Júlio Cesar Diniz, de 27 anos, conta que o cerol vem caindo em desuso por conta da oferta barata de linha chilena.
– Em qualquer lugar grande que vende pipa tem, e barateou muito de uns anos para cá, com R$ 10 você consegue comprar um carretel. Se for comprar em grandes quantidade na internet, consegue por R$ 5 cada um.
Fonte: Extra